“(…) Abbie Hoffman dizia que todos deveriam comer o que matam. Isso acabaria com as guerras.”
Three Pines é uma cidadezinha pacata, fora da rota turística, praticamente isolada. Uma comunidade onde todos se conhecem, aparentemente se gostam, vivem e respiram artes, tudo muito tranquilo, sem que os moradores vejam a necessidade de trancar as portas, temer qualquer criminalidade… até que o impensável acontece, Jane Neal, uma senhora de setenta e seis anos, professora local, amada por seus amigos, é encontrada morta no bosque atingida por uma fecha. A principio acreditasse se tratar de um acidente, pois a temporada de caça está em alta, e alguém poderia tê-la confundido com um servo. Tudo muda, quando um experiente inspetor, Armand Gamache, juntamente com sua equipe de investigadores da Sûreté du Québec, são convocados para a cena do crime e após algumas análises preliminares, custam a acreditar que se trata de apenas um acidente. Eles não encontram a arma do crime, e tudo os leva a crer que existe algo muito mais sombrio acontecendo. Os moradores ficam sem acreditar que alguém seria capaz de fazer mal a Jane, logo ela que era querida por todos. E agora tem essa mancha pairando entre eles, quem teria cometido tamanha brutalidade?
NATUREZA MORTA se revelou uma caixinha de surpresas, entregando muito além daquilo que eu estava esperando. Primeiro ponto importante a ser mencionado, é que o livro faz parte da coleção MISTÉRIOS EM SÉRIE, que visa entregar ao público obras de suspense, mistérios que tenham crimes, mas que não foquem na parte gráfica e sangrenta, aterrorizante, cheia de descobertas agonizantes e com isso quero dizer, que os enredos são feitos para alcançar praticamente todos os públicos, o foco são os personagens, suas rotinas e como suas vidas foram abaladas por um determinado acontecimento que foge do que eles esperariam, precisando de uma ajuda profissional para resolver tal situação, aqui encontraremos Gamache e sua equipe trabalhando com afinco para solucionar o mistério que ronda a vida e morte de Jane.
“(…) Ao fim de cada investigação, sempre havia uma resposta. E uma resposta que fazia sentido, pelo menos em algum nível. Para alguém. Mas, por enquanto, aquilo parecia loucura. Uma flecha de madeira antiquada com penas de verdade usada para matar uma professora aposentada idosa. Por quê?”
Quando conhecemos Three Pines, é impossível não se sentir fascinado por todas as características do interior, da cidade pequena, cheia de manias e detalhes pitorescos que só quem mora em uma – como eu -, consegue se identificar e rir do quanto aquilo é real. O leque de personagens que se abre a nossa frente é grandioso, como se toda a cidade estivesse participando da investigação, ou do crime em si. Um assassinato em um ambiente acostumado a segurança, onde todos se conhecem tende a causar impacto e virar o acontecimento do momento, atraindo a atenção de todos. E é desta forma que a história começa a surgir, com muitas apresentações, ambientação, diálogos, detalhes que parecem até exagerados, triviais… mas que não verdade, já são pequenas pistas.
A chegada de Gamache e sua equipe causa expectativas e conforme ele ali se instala, e começa a investigação, vamos nos dando conta, de que aparentemente nada é exatamente o que aparentava ser. Os canteiros, a vida desses moradores, tudo é revirado, expondo seus segredos mais obscuros, nos tornando ciente de que toda a paz que parecia reinar até então, só ocultava medos, ambições, cobiça e falsas intenções.
“Houve uma pausa. Gamache ponderou sobre aquela mulher, que havia escolhido viver com tantos segredos por tanto tempo e depois decidira expô-los todos. Será que havia morrido por causa disso? Aquela era a questão.”
O que me levou a entender o jogo que a autora fez com o título da obra e o enredo em si. Natureza Morta. A comunidade unida, feliz, segura, com pessoas que se amam, se respeitam, que trabalham para tornar a vida do pequeno lugar ainda melhor, todo o clima amistoso, perfeito e belo, imperturbável, como uma natureza retratada, emoldurada em um quadro, segurando entre a moldura até mesmo os pecados, as sombras, as mentiras, os segredos.
Para mim o grande diferencial do livro em relação a outros do gênero, não foi a escolha de apresentar uma história mais “adocicada”, e sim o fato de termos um investigador limpo, impecável. Gamache é um homem com mais de cinquenta anos, bem vestido, elegante, sério, de conduta exemplar, sensível e muito humano. Ele trata sua equipe com respeito, os escutando, dando poder de fala, mesmo que suas linhas investigativas e comportamentos, sejam contrários aos seus. Sem esqueletos escondidos no armário, traumas ou vícios. Apenas um homem que escolheu exercer a sua profissão com rigor e disciplina. Que inclusive é casado e muito bem casado, com uma mulher que o apoia, que entende sua profissão, o escuta e até oferece conselhos. Outro ponto que gostei muito foi a própria Jane. Todo seu excentrismo, a arte que incomoda, que embaralha os sentimentos, que arrancar e desperta as mais diversas reações de quem a observa pela primeira vez.
Eu gostei muito da leitura, da construção do mistério, de como a autora conseguiu sustentar ele por quase todo o livro, o desenvolvimento da investigação, dos personagens, a forma como ela explorou os cenários, todo o ar frio, outonal. Os personagens chamam a atenção por serem apenas verossímeis, humanos, que estão dentro de uma rotina, na normalidade do seu dia a dia, sem “perfeições”, com vontades, erros, acertos, escolhas… Enfim, uma leitura que eu recomendo muito.
Confesso que estou bem animada e ansiosa para ler GRAÇA FATAL, o segundo livro da série. Existe uma determinada personagem que estou curiosa sobre o futuro.
NATUREZA MORTA – Louise Penny
Sinopse: O experiente inspetor-chefe Armand Gamache e sua equipe de investigadores da Sûreté du Québec são chamados a uma cena do crime suspeita em Three Pines, um bucólico vilarejo ao sul de Montreal. Jane Neal, uma pacata professora de 76 anos, foi encontrada morta, atingida por uma flecha no bosque. Os moradores acreditam que a tragédia não passa de um infeliz acidente, já que é temporada de caça, mas Gamache pressente que há algo bem mais sombrio acontecendo. Ele só não imagina por que alguém iria querer matar uma senhora que era querida por todos. Porém, o inspetor-chefe sabe que o mal espreita por trás das belas casas e das cercas imaculadas e que, se observar bem de perto, a pequena comunidade começará a revelar seus segredos. Natureza-morta dá início à série policial de grande sucesso de Louise Penny, que conquistou leitores no mundo todo graças ao cativante retrato da cidadezinha, ao carisma de seus personagens e ao seu estilo perspicaz de escrita.
Ficha técnica:
Mistério, Policial | Louise Penny | Inspetor Gamache, Vol. 1 | Editora Arqueiro | Mistérios em Série | 2022 | 1º Edição | 304 páginas | Tradução: Natalia Sahlit | Classificação: 4/5 | Onde encontrar: AMAZON – SKOOB
Até a próxima! Bye.
