As Heroínas – Kristin Hannah | Editora Arqueiro

por Biia Rozante
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Caros leitores! Existe algo hipnotizante nas letras de Kristin Hannah, aquele detalhe a mais que mesmo não sabendo como nomear, sentimos desde a leitura da primeira frase. Ela tece sua teia, joga em nossa direção, ativa nossas emoções alcançando lugares que nunca antes tínhamos acessado ou pensado em acessar. É a maestria de uma autora que sabe exatamente onde quer chegar e o que quer falar, deixando sua marca enraizada como uma cicatriz que seguirá ali para nos lembrar o que é importante.

Frances McGrath, sempre escutou histórias da guerra, contadas pelos homens de sua família, tratados como heróis, expostos em uma parede de exibição, que exala orgulho e gratidão para com aqueles que lutaram bravamente por sua pátria. Um legado, que seu amado irmão abraçou, ele vai para o Vietnã. Criada na pequena cidade de Coronado Island, privilegiada pela condição financeira de sua família, foi educada para ser a jovem/mulher “perfeita”, bem educada, conservadora, com valores e princípios rígidos, preparada para o casamento e a maternidade, sendo mulher, era isso o que esperavam dela. Entretanto, algo pulsava, um chamado que ela não compreendia ou ousava dar nome, até que a seguinte frase é dita: Mulheres também podem ser heroínas.

“Aqui a vida é curta, e os arrependimentos duram para sempre. Quem sabe ser feliz agora, ser feliz por um momento, seja tudo o que a gente possa ter. Ser feliz para sempre parece muito para pedir em um mundo em chamas.”

Alguns meses se passam e Frankie segue trocando cartas com o irmão, em seus relatos sempre existe muito humor, Finley parece imensamente feliz, encontrado seu propósito servindo na marinha. Em sua dolorosa ausência, Frankie tenta seguir sua vida, aumentando sua carga de estudos e se formando em enfermagem. Sua inquietação sobre fazer a diferença, mudar o mundo, orgulhar seus pais, fazem com que ela tome uma decisão; se alistar no corpo de enfermagem do exército, ir para a guerra junto com Finley, servir ao seu país. Só que as coisas não saem exatamente como ela imaginou e almejou.

Após seu treinamento, Frankie é enviada, e é aí que tudo muda. Sua recém-chegada já é marcada pelo cheiro da guerra, o ar é espesso, a água insalubre, sua “inocência” sendo despedaçada em milhões de pedaços. Seu primeiro trabalho é marcado pelo desespero, agonia, a sensação de insuficiência, de que nada nunca será o bastante, de ter tomado a decisão errada, de que não vai conseguir, que ali não é seu lugar… Mas, será a guerra o lugar de alguém?

— Vamos salvar muitas vidas hoje, Frank. Mas não todas. Nunca todas.”

AS HEROÍNAS, é o tipo de livro que despedaça e esfrega verdades em nossa cara difíceis de serem digeridas. Dividido em duas partes, vamos primeiro encontrar Frankie jovem, dona de uma doçura cativante, com sonhos, planos, inocência, e vontade de fazer a diferença. E ainda que ela consiga conservar uma parte de si, estar no meio da guerra faz com que ela confronte tudo, seus ensinamentos, sua fé, sua postura, seu conhecimento, força e capacidade. E ver seu crescimento e amadurecimento é lindo, é como ver uma flor desabrochar em meio a um espinhal. Neste primeiro momento também nos deparamos com o horror da guerra, o caos, a dor, o pânico, os corpos mutilados, jovens despreparados, fake news, o controle sobre a mídia e o seu efeito, mortos, mais mortos, sangue, bombardeios, o sofrimento de inocentes… E por mais absurdo que possa parecer, também encontramos beleza, no coração generoso, nos alistados que fazem de tudo para salvar vidas, nos laços de amizade que se tornam família, e o experimentar de um amor. Frankie descobre sua vocação, entende que a enfermagem é o que ela é, e com muita dedicação, ela se torna uma das melhores. Quando sua dispensa enfim chega e ela vai para casa, depois de servir por dois anos… nos deparamos com a segunda parte e ela não é mais bonita ou fácil – NÃO EXISTIA MULHER NO VIETNÃ.

“Frankie nunca falava de suas dificuldades, tentava jamais dizer Vietnã em voz alta. E quanto sentia a pressão subir, uma onda de tristeza ou de raiva, abria um sorriso nervoso e saía do cômodo em que estava. Tinha aprendido que as pessoas notavam um tom de voz elevado. O silêncio era a camuflagem perfeita para a dor.”

Vamos nos deparar com o apagamento da mulher na guerra do Vietnã. A mulher que serviu e que não pode dizer que o fez, porque isso traz vergonha para sua família. O país que antes se orgulhava de estar indo para a guerra, agora culpa seus soldados por ela. A diferença do tratamento entre homens e mulheres. Indiferença, desdém, falta de acolhimento e respeito. É como se o pensamento dos que tiveram o privilégio de não estar em batalha fosse de; Não fale sobre a guerra, porque se ninguém comentar, se ela não for mencionada, podemos fingir que nada está acontecendo, seguir com nossas vidas… ainda que lá, muitas estejam se perdendo.

Existe tanta dor, raiva, uma frustração tão grande que com o passar do tempo vai se tornando impossível de ser controlada, são muitas as emoções que precisam ficar sob rédeas. Você consegue se imaginar vivendo com a dor da Frankie? Consegue se colocar no lugar dela, ou de qualquer outra mulher que lá esteve, fazendo mais do que o seu trabalho, aguentando mais do que um dia imaginou ser capaz, salvando vidas, ou sendo o último rosto, a última voz que alguém ouviu, voltar para casa, para o seu país e ser silenciada. Não pode falar sobre, as pessoas não querem saber como você está de verdade, o que você viu, o que você fez, elas não querem sair da bolhinha da paz, do mundo cor de rosa. Mas você precisa esquecer que esteve lá, ainda que sua mente borbulhe com as memórias, que os pesadelos não te dê trégua. Esqueça, deixa pra lá, não importa… ainda que essa parte seja uma parte sua, um pedaço teu, apenas siga em frente. Como se ir para a guerra, fosse apenas um passeio no parque.

“Como ela poderia deixar aquele hospital e as baixas — americanas e sul-vietnamitas — que precisavam dela? Frankie tinha ido até lá para fazer a diferença, salvar vidas, e só Deus sabia quantas vidas ainda precisavam ser salvas.”

Consegue se imaginar pensando que lá na guerra, mesmo com o risco iminente de morte, mesmo presenciando diariamente a destruição, você se sentia parte de algo, sabia o que de você era esperado, seu papel, como se portar… mas que em casa você se tornou um estranho sem controle. A sensação de não pertencimento, de não ser compreendido, de não te entenderem, porque  não querem te ouvir. A guerra é um inferno, é cheia de carnificina, terror, mas o mundo “real” para o qual você voltou, está todo desconectado. Você não sabe como lidar com você, com o misto de emoções crescentes, com o que está acontecendo dentro de você e de maneira descontrolada, você sabe que é como uma bomba relógio, mas não sabe como desativar e vai explodir.

Que livro INCRÍVEL! Que história potente. AS HEROÍNAS, veio e vai permanecer comigo por toda a minha vida. É um relato de guerra, de sacrifício, de apagamento da mulher, mas também é sobre esperança, força, resiliência e luta feminina. É sobre família, amizade, perdão e amor. Sobre a dor, o luto, a guerra nua e crua, um verdadeiro inferno que devemos sim temer. Com uma narrativa rica e emocionalmente envolvente, Kristin Hannah prende o leitor da primeira à última página, e marca nossos corações com emoções que ficam a flor da pele, aqui você vai, chorar, querer gritar, sorrir, sofrer, torcer, questionar as motivações da guerra, os interesses por trás, suas consequências, e aplaudir as heroínas desta linda e agridoce história.

“ (…) —  Mas nós não somos estranhas, não é? Somos mulheres que foram para a guerra, somos as enfermeiras do Vietnã, e muitas de nós se sentiram silenciadas em casa. Nós perdemos quem éramos, quem queríamos ser…”

Preciso fazer duas menções honrosas a Ethel, sua força interior e resiliência são evidentes em cada decisão difícil que precisa tomar, uma luz que acolhe, abraça e ensina. Barb, uma jovem idealista, movida pela paixão e pelo desejo de fazer a diferença. Envolvida nos protestos contra a guerra, ela representa a voz de uma geração que clama por paz e mudança. Sua jornada revela as complexidades e as divisões da sociedade americana durante esse período turbulento. Duas mulheres que fizeram a diferença, com bravura e compaixão, que foram co-protagonistas desta história, unidas a Frankie para representar a todas nós mulheres.

Se não ficou claro ainda, irei dizer com todas as letras, EU AMEI. Fui drenada emocionalmente, sofri, aprendi e vivi intensamente essa leitura. Ela me sugou para dentro de suas páginas e foi uma verdadeira avalanche de emoções. E nada do que eu tenha dito aqui, faz jus ao valor e potencial desta obra. Por isso, irei deixar mais que uma forte recomendação, irei deixar um clamor, para que você a leia também.

(Vou deixar esse espaço aqui reservado para as últimas quatro linhas desta história, eu queria tê-las colocado aqui, mas assim como eu, quero que você viva a experiência de lê-las pela primeira vez no encerramento da história, sendo assim… quando você ler o livro, você vai entender.)

AS HEROÍNAS – Kristin Hannah

Sinopse: Mulheres também podem ser heroínas. Quando a jovem estudante de enfermagem Frances McGrath ouve essas palavras, sua vida ganha uma nova perspectiva. Criada na idílica Coronado Island e superprotegida pelos pais conservadores, ela sempre se orgulhou de fazer a coisa certa e de ser uma boa garota. Mas o ano é 1966 e o mundo está mudando. De repente, Frankie começa a imaginar um futuro diferente para si mesma. Quando seu irmão vai servir no Vietnã, ela age por impulso e resolve se juntar ao Corpo de Enfermagem do Exército. Tão inexperiente quanto os soldados, Frankie logo se sente sobrecarregada pelo caos e pela destruição, mas consegue encontrar apoio em outras enfermeiras. Ao voltar para casa, ela precisará enfrentar novos traumas diante de um país dividido politicamente que não dá o devido valor aos serviços prestados no Vietnã. Apesar de se concentrar na vida de uma única mulher que foi para a guerra, As heroínas honra as histórias de todas que se colocaram em perigo para ajudar os outros, cujo sacrifício e comprometimento foram esquecidos por seu próprio país.

Ficha técnica:

Romance Histórico | Kristin Hannah | Editora Arqueiro | 2024 | 1ª Edição | 2024 | 416 páginas | Tradução: Natalia Sahlit | Classificação indicativa: 16+ | Cortesia | Minha avaliação: 5/5 🖤 | Onde encontrar: AMAZONSKOOB.

Até a próxima! Bye.

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