A TERCEIRA MARGEM DA FOLHA – Thiago Arantes | Artêra Editorial e Appris Editora

por Biia Rozante
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Olá, pessoas! 

Estou tão feliz em poder compartilhar essa leitura com vocês, fazia muito tempo que não lia nada remotamente parecido com o que aqui encontrei. Em A TERCEIRA MARGEM DA FOLHA mergulhamos no cotidiano de maneira muito especial. Com uma narrativa envolvente e poeticamente construída, o autor explora os limites entre realidade e fantasia, tecendo enredos que desafiam as percepções e instigam reflexões profundas. 

Arantes possui uma linguagem rica, sensível, criando ambientes fantásticos, oníricos e profundamente reais, onde cada página revela possibilidades, é um convite para se perder nas entrelinhas, no não dito, mas que paira… é descobrir que, às vezes, a verdadeira história se esconde nas margens do que é escrito, ou sentido. 

Dividido em 12 contos, a obra é de realismo mágico, onde cada conto vai te provocar, instigar e te fazer se identificar com as experiencias fantásticas que ali ressoam. E eu vou comentar um pouquinho de como me senti com cada uma delas.

 AZUL POESIA 

Sobre enxergar o mundo de duas óticas diferentes, uma mais otimista e colorida, enquanto a outra se revela sempre cinza, e se agarrar ao lado bonito porque é o que mais agrada, até que se perde esse véu da inocência e da doçura, se ressentido do mundo, de sua violência, do que amargamos e permitindo que essas coisas apaguem o que antes era belo e simples. E então perceber que o equilíbrio, o acesso ao belo esteve o tempo todo dentro nós, mas, que esquecemos de como enxergá-lo também. (Este é o meu segundo conto favorito). 

“A mãe nada assistiu com os olhos da matéria, mas viu o filho vestido de sorriso sem medida de dente, sem medida de gente, e pressentiu tristezas ao pequeno, porque o mundo, quanto muito, não era para as pessoas lavadas em esperança.” 

TRATADO DO TEMPO 

Sobre o tempo que passa sem controle, e em como falhamos em apreciar cada pequeno momento, achando que nosso tempo é infinito, não percebendo que a nossa porta ele está espreitando e que uma hora ele acaba. 

“Tomou em seus braços magros e na última luz do dia viu-se como a muito não se via. Havia um velho refletido. Rugas fazendo covas fundas na testa desnuda. Quem seria aquele? O jovem que um dia partiu atrás de respostas? Talvez sim, mas era outro ele. Manso e pacificado, e mesmo velho e enferrujado não deixou de sorrir, porque o tempo é senhor de si.” 

A TERCEIRA MARGEM DA FOLHA 

Um pai que decide se tornar escritor, compra uma máquina de escrever, se isola do mundo e nunca mais sai daquele ambiente montado para a escrita. O pai perde a infância do filho, o contato com a família e o mundo exterior, se isolando, o tempo passa e passa e então um dia, o filho se adentra neste local sagrado e o encontra estirado em frente à mesa. É muito curiosa a forma como sentimos que o tempo para esses personagens se passa de maneira diferente, um atingindo o inconsciente, um lugar de sonhos, paralelo ao seu redor, enquanto o outro vive o que é chamado de cotidiano, comum, e que no momento que se depara com a cena de morte, invoca para si o desejo de viver neste mesmo lugar, o encanto e a potencialidade de poder sonhar. 

(…) Levantei-me como rinoceronte. Tirei a folha da máquina. Amassei como se tivesse martelo nos dedos. Tropecei em tantos porquês que meus dedos sangraram. Tranquei a porta e engoli a chave. Para agora, o nunca mais era um bom tempo.” 

PROCURA 

Santiago em sua busca por si mesmo, faz com que pensemos sobre nossas próprias buscas e onde as temos buscado. É um conto interessante sobre o que éramos, o que somos e o que queremos ser. 

“(…) O tempo não é amigo dos que não sabem seu destino e esse quintal é um enorme deserto.” 

SETE LENÇOS 

Esse aqui nem tentando muito consegui colocar em palavras o que entendi. Vou deixar vocês com as palavras do autor. 

“Agora já não disse uma palavra porque não lhe cabia, não porque lhe minguava a língua. Desceu a rua no mesmo silêncio que se faz por dentro. Inspirava o ar, inspirava toda aquela situação, respirava a reflexão. Crendice ou tolice, presságio ou devaneio? Não importava, porque veio.” 

CAUSA MORTIS 

Um homem morto, caído em frente a um prédio, curiosos a sua volta, e uma folha de papel. Qual seria a causa? Uma senhora astuta prestava atenção a tudo e com muito orgulho tenta ajudar os policiais e resolverem o caso. Às vezes a resposta, é o mais obvio, e esteve bem ali, ao alcança das mãos. 

“Alguns segundos em que ninguém se falou, ninguém se mexeu, engessados pelo assombro, pela dúvida e pelo raciocínio, que colapsou com a fala da senhora. O policial, então, tomou a iniciativa que ninguém até então presumira: pegou a folha e, lendo-a, buscou explicação para o que estava vendo. Espantou-se, como se alguma verdade ali morasse…” 

ALITERAÇÕES 

É um conto sonoro… quase musical. Com repetições bem marcadas. Esse é o tipo de conto que busca fazer o leitor de alguma forma o sentir. 

“(…), Mas sei que virá haver o dia de algum alguém almejando saber o que escondia, receber de minhas mãos o alimento da sabedoria.” 

SENTIR FAZ SENTIDO 

Este é aquele tipo de conto que a cada releitura ganha uma nova camada. À primeira vista parece simplista, um homem em decadência, entregue a um ciclo vicioso, aparentemente sem nenhuma ambição ou esperança… até que se depara com uma jovem vendendo flores e a partir deste encontro um tranco, uma segunda chance, um chacoalhar que o leva a algo completamente novo. É palpável sentir esse choque de vida que o inunda. 

“A mesma manhã, o mesmo sol, e tudo diferente, diferente, diferente… Coisa de quem sente. Sentir faz sentido. Ainda mais para os esquecidos de que os sonhos acontecem na medida do impossível.” 

ENGASGO 

Este conto é potente. Aqui conhecemos um jovem quando ainda bebê em seu nascimento e que som nenhum emitiu, não chorou… na adolescência, se tornou um aluno exemplar, muito inteligente, porém incapaz de se comunicar de maneira oral, e com isso não fez muitas amizades, nem se enturmou, pois para isso lhe era necessário a fala. Até que um dia, em tamanha agonia começa a expelir páginas inteiras pela garganta, páginas ensanguentadas e preenchidas com respostas as suas dores e silêncios. Tanto engoliu, tanto deixou passar, tanto suportou, tanto se calou, que um nó se formou e o engasgou. 

Preciso dizer mais alguma coisa? O que você tem engolido, que palavras e sentimentos têm ficado entalado? (Meu terceiro conto favorito) 

(…) Uma vida ou uma morte redigida na voz que nunca ganhou corpo. (…) Nem mudo, nem conformado, este viveu e morreu Engasgado.” 

DESERTO DENTRO DE MIM 

Foi um sonho, uma alucinação, uma visão, ou tentação? Poderia também ser real? Um homem triste que de súbito acorda em um deserto ao lado de um amigo tão espantado quanto ele… irão perseguir algo brilhante que ao ser encontra revela-se um espelho, e ao ser encarado, oferece uma outra versão do que ali deveria ser refletido. 

(…) Não sei cai em um deserto do nada: ou seria a morte ou seria propósito, ou seria um norte ou seria precipício. De qualquer forma, um Fim ou Início…” 

PÉS DE BARRO 

Um homem em seu velório a espera de uma despedida, ou melhor, do perdão… Para os seus pés tem levado? 

“(…) fecha os olhos, descalço, só a culpa em seu encalço, e vai, sozinho encarar caminhadas em outras Terras, enquanto esta terra daqui recebe, enfim e por fim, os pés que tanto conhecia.” 

O JOGO DAS CULPAS 

Este é o meu conto favorito. E eu só posso desejar que vocês o leiam, porque me faltam palavras para descrever o quanto ele significa. De quem é a culpa? E se mesmo quando fazemos o que julgamos ser o certo, aos olhos externos isso for errado? Existe certo ou errado? Para cada ação uma consequência… nada passa ileso. (Gosto muito deste conto também). 

“A bondade nem sempre encontra agradecimentos.” 

Prepare-se para embarcar em uma aventura literária instigante, onde o poder das palavras transcende o papel e nos leva a refletir sobre nossa própria jornada entre as margens da realidade e da ficção. 

Antes de me despedir, preciso trazer uma curiosidade, o livro é uma homenagem ao conto clássico e irretocável – A TERCEIRA MARGEM DO RIO, do autor Guimarães Rosa. Já fica aqui o convite, para se caso você ainda não o conhecer, que aproveite para ler. 

A TERCEIRA MARGEM DA FOLHA – Thiago Arantes

Sinopse: Estranho sucedido, espanto desmedido das coisas que habitam os mundos humanos: “Tudo é Divino, Tudo é MARAVILHOSO”, basta-nos olhar com os corretos olhos para ele encontrar. Seus povos: corpos, sangue e ossos, rígidos na matéria bruta, nesses mundos humanos, retos, namorados da razão, regidos pelas leis instransponíveis em que foi erguido, em que o Fantástico é a exceção nos vídeos da televisão ou nas páginas de um livro. Esse seria o seu destino? Onde estará, Senhor, o brilho do inexplicável que colore, como tinta de poesia, a vida vivida entre a jornada diária? Permita-se, Caro Leitor, na leitura desta obra, deliciar-se com o casamento do Impossível com o Ordinário em carinho contínuo e pacificado.

Ficha técnica: 

Realismo Fantástico, Contos | Thiago Arantes | Editora Appris e Artêra Editorial| 2024 |1º Edição | 100 páginas | Cortesia | Minha avaliação: 4/5 | Onde encontrar: SKOOBAMAZONAPPRIS EDITORA

Até a próxima! Bye.

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